Onde está o Uber da segurança pública?



Ontem, caminhando na rua de cima da minha casa, me deparei com uma mulher assustada que vinha em minha direção:

Moço, moço, não vai pra lá não, que um rapaz acabou de ameaçar uma mulher ali daquele prédio com uma faca enorme!

Na mesma hora liguei pra polícia militar. O que se seguiu foi uma conversa pautada num protocolo que se explica, mas não se justifica. Apenas um exemplo: 

O senhor pode me dizer aonde foi?

– Claro, eu estou na rua Rafael Magalhães em frente ao número 71, no bairro Santo Antônio.

– O senhor pode me dar uma referência?

Pensei comigo: A senhora já ouviu falar em google maps? E disse que não podia, porque não tinha nem um comércio que fosse referência ali. Ok, imagino que uma quantidade enorme dessas chamadas sejam originadas em vilas, "favelas", regiões de periferia que sequer tem um nome de rua e um número confiável... Mas o protocolo que explica a atitude da atendente que gritou comigo - sim, gritou; podemos pedir a gravação para comprovar, tanto que eu pedi que não gritasse e ela começou a dizer que estava ouvindo mal e que por isso estava gritando (foi quando eu disse que a ouvia perfeitamente e que podia parar de gritar, por gentileza) - não justifica o completo retardamento do apoio à comunidade.

Nesse ponto, eu perguntei a ela se podia me dizer se tinha alguma viatura próxima, porque já havia quatro pessoas esperando pra seguir a rua, sem saber se seriam coagidas por um mequetrefe portando uma faca de churrasco. 

Meus 25 anos de karate me dizem que minha filha de 5 anos é mais importante do que o risco de testar minhas habilidades. 

Até o nome do assaltante eu sabia. Ele fez a mesma coisa com dois amigos meus, em dias diferentes, no mesmo bairro, e com um outro em um ônibus do mesmo bairro. Mesmas características, mesmo padrão, se bobear, mesma faca. A polícia já o prendeu diversas vezes e o solta novamente. Outro dia, soube que o traficante da região deu uma surra nele, porque ele estava atrapalhando o comércio na beira do "morro do papagaio". 

Pensei: será que ele vai ter que matar um pai de uma menininha como eu pra que  o traficante resolva a situação? Porque... com o preparo da polícia hoje em dia, seus equipamentos de última geração, os protocolos bem elaborados da década de 80 (imagino), as leis vigentes, a rapidez com que são processadas as demandas da segurança pública, sei não... Lembro que a Polícia Militar de Minas Gerais já foi muito conceituada. De dar cursos fora do país. E que tínhamos um estado considerado seguro. 

Segui, no meio da rua, sem o apoio da polícia, com o computador na mochila, lembrando que o último havia sido furtado, porque a reunião me aguardava, enquanto as outras três transeuntes (todas mulheres) ficaram paradas, discutindo que rumo tomar.

Não, ela não podia me dizer se a viatura estava próxima. E nem quando chegaria ao local.

Penso no seriado 24 horas, que foi sucesso absoluto há poucos anos. Não desista de ler por esse comentário, já me explico.

Jack Bouer, agente do FBI (acho, ou da CIA, não importa) tinha uma equipe que ficava na base de apoio dando dicas pra ele. Reveja um dos episódios da série se não se lembra bem. A grande ajuda, quase sempre, não passava de rastreamento por satélites e indicações de GPS. Banalidade que hoje temos no celular, que está em nossas mãos. 

E porque não estaria nas mãos da polícia? É claro que está. Mas das mãos da polícia para as da sociedade parece que tem um abismo colossal.

Porque não tenho um aplicativo onde vejo onde estão circulando os carros de polícia em meu bairro, em minha vila, em minha comunidade para que, no mínimo, eu me sinta um pouco mais seguro?

Onde está o Uber agora para disponibilizar a tecnologia para os governos municipais, negociando o bem comunitário em troca da permissão definitiva dos seus serviços? Ou, porque ninguém cria um aplicativo de segurança comunitária? Ou, porque não colocamos todos os "telemarketing" (porque parece que não passam disso) da PMMG nas ruas dando voltinhas nos quarteirões em duplas, enquanto um dispositivo direciona as chamadas diretamente para os aplicativos nos bolsos dos soldados, cabos, sargentos, carros, motos, enfim?

É realmente uma pena achar que é mais fácil esperar o Watson da IBM ser comprado pela polícia militar do que haver treinamento de pessoal que pense para responder, ao invés de seguir pura e simplesmente um protocolo, enquanto nos sentimos frágeis precisando de filmes de hollywood pra continuarmos com a fantasia de que seremos salvos. 

Eu só não quero que minha filha queira me abraçar e não possa. Eu só não quero que alguma filha queira abraçar seu pai ou sua mãe e não possa. Porque a única coisa no mundo que realmente tem importância é um abraço.



Comentários

Rolgama disse…
tb só queria querer abraçar o meu pai e poder.
sábia decisão.

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