A onça que faz au-au




Pegamos você e sua mãe 14:30h da tarde, filha.
Sua avó já não sabia mais onde colocar seu coração, que pulava de alegria, assim como o meu. Ontem, quando sua mãe cancelou a ida ao zoológico e marcou pra hoje, sua avó já começou a sonhar. Eu corri no seu quartinho e peguei todos os 11 bichinhos de fantoche de dedo que comprei pra você pra deixar separado. Eu sabia que teríamos a oportunidade de imitar os bichos juntos, seus sons, seus trejeitos, cada uma de suas macaquices... Eu queria saber se você ia entender a relação dos bichos com os fantoches, se ia fazer seus sons depois que estabelecesse essa relação. Com um ano e três meses, pra você isso é fácil, tendo em vista que maneja um Iphone bem melhor que sua avó (se bem que a comparação não lhe favoreceu, filha).
Seus olhinhos brilhavam como os de sua avó quando chegou no carro...
Pegamos a Afonso Pena, rumo a Pampulha e é incrível como tenho que me policiar, pra não ficar com os olhos somente no retrovisor. Tudo que quero ver não está fora do carro, filha, está dentro.
Sua mãe do seu lado lhe dava a segurança que ela precisava. Não você.
Quantas vezes já fomos juntos pro síto, quando você ainda morava aqui e tomamos nossos banhos de banheira, rimos a valer, nos maravilhamos com as coisas simples de pai e filha, com a água, com o barquinho de plástico, com nosso bom humor natural?...
A vida é cheia de barquinho de plástico pra gente se maravilhar, filha. Só não podemos nos esquecer disso.
Chegamos ao zoológico! e, é claro, eu estava doido pra saber qual o bichinho que você ia gostar mais. Sua avó tinha certeza que era o macaco, achava que você puxaria seu avô, que adora macaco e suas macaquices, filha. Eu sabia que você ia amar a girafa, arquear a sobrancelha impressionada com o tamanho do seu pescoço, achar engraçado o macaquinho, apontar pro elefante: – oh, oh!...
O elefante é grandão, né filha?
E que engraçado que é o hipopótamo, amor de papai?
Sabe o quê, papai também nunca gostou de jacaré. Seu franzir de testa me disse tudo. Quê isso, pai? Também não sei, filha, parece um dinossauro que esqueceu que foi extinto. E o leão? GRAAAAAAAAAAR... Que garras, hein, filha?!?
É bom ver seu olhar de curiosidade, é bom ver você chamando a onça de Au-au, é bom o seu gritinho quando a arara grita. Foi bom poder sentar na grama e compartilhar esse momento muito seu, único, mágico, de descoberta total, ao lado da sua mãe e da sua avó, que se dispuseram a sentar na grama enquanto pegamos os fantoches de dedo e imitamos os bichos que tínhamos visto... Um lanche, uma água de coco, um sonho desperto na cabecinha de uma criança linda como você. Ah, e quantas e quantas fotos lindas!!! Imagino você com 15 anos, vendo essas fotos e comentando com a gente...
Uma esfregada de olho e um bocejo, contando que tava na hora de ir, que foi muita emoção junta por um dia...
Um dia maravilhoso, pra ficar marcado para sempre na sua história, na história da sua avó, na história de seus pais...

Se não fosse por um detalhe: não passou de desejo e expectativa. Às 14:30h, quando chegamos na porta da casa da sua avó materna para pegar vocês, sua mãe mudou de ideia, e não quis que fossemos mais ao zoológico, como estava marcado por ela, depois da minha insistência...
Pena. E me dói imaginar sua avó indo sozinha pro sítio, depois de ter batido com a cara na porta, olhando pelo retrovisor sua cadeirinha vazia, que insiste em nos perguntar: cadê a dona desse lugar vazio?

Um dia ainda vamos juntos ao Zoológico, filha. Amanhã, ano que vem, daqui há dez anos, não importa. O papai promete.

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