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As quaresmeiras da rua Zuzu Angel

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Quem desce a rua Zuzu Angel no Belvedere andando ou correndo tem o privilégio desse encontro. Já percebi que quanto mais cedo melhor, pra se ter uma luz adequada ao rosa chamativo das quaresmeiras, que lá estão de plantão, à espera de mais um desavisado que passa e se surpreende. Os corredores frequentadores do bairro, que forem um pouco mais atentos, certamente sabem onde elas estão. Uma fila de 5 ou 6 quaresmeiras, todas rosas, que chamam a atenção de quem gosta das surpresas simples (?) da mãe natureza.  Poderia fazer um link aqui com o fato da rua se chamar Zuzu Angel. Iria explorar o bordado, o ponto de cruz, as cores, o grito da linha, o furo da agulha.  Veria os dedos sangrando, pensaria nos nós. Teria como cor a semente, brotaria em meu texto uma flor menos rosa, mais pálida, sujaria de terra as palavras bonitas.  Mas não posso. Não sou mãe. Não estou preparado para o rosa, para o buquet, para a coroa. Só posso passar correndo e admirar o fato da maioria das quaresmeiras estare

Escolha você mesmo a ordem deste título: para quem vai / ler um poema / dá medo mesmo

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Sinto falta de você, ao acordar sinto falta Tenho medo de sentir, ao lhe dizer sinto falta Não entendo o que vivi, a intensidade, a confusão, o sorriso Cabelos na testa, produção de sentidos Efusão de significados, ebulição de motivos Vontades que se confundem, amores que se completam Olhares intensos, profundos, horas a fio de olhares Gillette que risca o cristalino do olho Vejo um coração aberto, apertado, sofrido O medo de amar dominando o aflito A busca incessante pela memória do cheiro que esconde a profusão de sentidos Acorda pra vida, vem sofrer, vem amar Vem aventura de viver e gostar, e gostar, e gostar Estremeço e não julgo mais Amanheço e não me iludo mais Entardeço e não procuro mais Reconheço e espero os sinais Viva te tudo, de tudo, tu dedo Apontado pra árvore que brota na lua...

O título pode ser "Curto House". Ou "House Curto"

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House (enfático): - Se não está feliz do avião, pule! A vida é perigosa, complicada... E a queda é grande. Paciente (assustado): - Você tem medo de mudar? House : - Você é que tem. Prefere imaginar que pode escapar em vez de tentar. Porque, se falhar, não terá nada. Então desiste de algo real e se agarra à esperança. O problema é que a esperança é para os covardes... Poderia acrescentar a esta pinçada que fiz na quarta temporada da série de TV House, um pensamento de David Hume: "O hábito pode nos levar a crenças e expectativas,  mas não ao conhecimento,  e menos ainda à compreensão das relações legítimas." Ou algo de Sêneca: "Pelo fogo se prova o ouro; pela adversidade, os fortes." É bom perceber que um bem cultural de massa pode ser interessante, inteligente, instigante.  A Sociedade do Espetáculo , como bem cunhou o pensador Guy Debord, tem surpresas interessantes pra quem souber selecionar. Dominique Wolton - outro pensador da Comunicação - em seu

Três pontinhos

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Posso passar horas aqui escrevendo. Posso passar dias.  Mas não quero.  Quero simplesmente falar o que ouço. Talvez não haja nada legitimamente novo ou original a ser dito, que precise ser garimpado dos recônditos de minha alma, de meu verso, de meu verbo. Novamente vem aquela passagem bíblica... " e o verbo se fez homem e habitou entre nós " (JOÃO 1:14). Acho sinceramente isso extremamente bonito. Não quero convencer ninguém disso, ou fazer apologia à poesia bíblica ou à poesia de fé, mas é preciso ser dito.  Talvez porque já ouvi... Ou isso seria original? Quis muito te encontrar, pra dizer de meus medos, agonias, fantasias, mas me encontrei. E finalmente disperso em pensamentos que, acho eu, me farão prolixo demais pra um encontro, outro encontro, novo encontro, seja ele de que natureza for... Detesto colocar três pontinhos em textos. Fico pensando que esse é um artifício manjado, utilizado pelos fracos, pra entregar a outros a responsabilidade pela construção da históri

Miserinha

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Entrei na igreja.  Fiz valer minha fé. Curei enfermos, impus a paz, renasci melhor.  Renovado.  Renoivado. Apaixonado pela vida, em consonância com O som - se é que essa alegoria é possível. Broto que rompe a semente, broto que rompe, casulo rasgado - nesga de sol. Deito sem compromisso e me ponho a velejar, meu barco imaginário brincante das águas possíveis: Miserinha do Mar é seu nome. Sobe e desce. Desliza fácil por sobre as cristas, corte de navalha que não fere nunca, só escreve letras gigantes no mar. Suas curvas, perfeitas. Seu traço é firme. Seu barulho inconfundível. É Miserinha do Mar a cortar o vento, faca quente no pote de manteiga. Meu pão se fecha. Dou uma mordida no corpo de Cristo, bebo o vinho, faço sinal da cruz, me abençôo e meus familiares... Vão com Deus, gente!

No vê-lo

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Novelo. Alegoria mítica, instrumento usado por Teseu para achar o caminho de volta no/do labirinto do Minotauro.  Instrumento?  Talvez eu devesse usar a palavra dispositivo , ao invés de instrumento.  Nas minhas associações semióticas sem compromisso, vejo o novelo como dispositivo , lembro do termo decisivo na estrutura do pensamento do Foucault:  " Conjunto de resoluções heterogêneas que compõe o discurso, as instituições, instalações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, anúncios científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas... em resumo, tanto o dito quanto o não dito: eis os elementos do dispositivo . É uma rede que se estabelece entre elementos e tem uma função estratégica dominante. É uma manipulação de forças, invenção racional, sempre inscrito no jogo de poder. " ( retirado dos meus estudos revisados por minha professora de francês do texto Qu`est-ce qu`un dispositif? ) Interessante... e paradoxal! Como uma imagem tão c

No cantinho

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As cores despertam na praia. Se rendem ao sol, todo poderoso. Há sombras, há tonalidades, matizes que brincam com minha percepção. A areia que queima o pé me faz lembrar o sorriso menino de uma menina. De hábitos diurnos, é também dourada. Se apresenta e se esconde. Ela venta. Sopra encantos possíveis na minha natureza já explorada. Pouco deve haver em mim a desbravar. Mas o vento é criança. Pega no pé do inconcebível e atravessa as fronteiras do estipulado.  Fui pêgo. Na gaiolinha de bambu, frágil, poética, ouço o estalar seco de seus finos arames de pau. Rangem ao meu movimento. Parecem dispostos a partir, a romper a um sinal. Mas não quero. Quero esperar o jiló. Quero o banho na vasilhinha que tem lôdo no cantinho. Quero sentar meus sonhos no puleiro do alto e descobrir em qual prego a gaiola vai se pôr.