De passageiros a condutores de suas próprias vidas


O Trem das 7 segue cadência, por entre as tantas montanhas de Minas. Projeto rico, idealizado e posto pra rodar com a lenha dos maquinistas Tio Flávio, Érica Machado e Tânia Campos, encontrou sua estação no Albergue Municipal Tia Branca, da região centro-sul da capital mineira. Lá, pessoas em situação de rua tentam se refugiar das tantas perdas da vida, para se refazerem e continuarem a caminhar.

São muitos os motivos que levam as pessoa a encontrarem essa situação em suas vidas. Um deles, o orgulho. É muito difícil aceitar que a engrenagem do mundo não tem como eixo o antropocentrismo umbilical. Outro, o medo. Será que vou ser julgado? Será que vou ser ouvido? Será que vou ser ferido? A droga do crack, a droga da bebida, a droga do fumo são só o segundo passo de quem já deu o primeiro na beirada do precipício. Muitas vezes, não há tempo de olhar para trás em busca de uma mão que nos segure, que não nos deixe cair.

A batuta da Alcione conduz com maestria, pulso firme e carinho, o ritmo da música orquestrada que soa nos vagões do Trem das 7. Pequena, altiva, sabe bem seu tamanho no mundo. Oferece sua mão para quem volta os olhos do precipício e sabe bem como ter pulso forte para segurar quem cai.

Nem toda palmada deveria ser banida. O mundo nos dá palmadas para as quais deveríamos estar preparados. A crise social, a falta de esperança, a ênfase desenfreada no consumo como única forma possível de redenção (ou reconhecimento de sucesso) são ingredientes amargos na panela do nosso almoço diário. 

De passageiros a condutores de suas próprias vidas. São três vagões: o do coaching pessoal - que os faz refletir, o do empreendedorismo - que os faz voltar acreditar na linha da vida, e o do simbólico - do grupo Corredores DA Rua, que os faz compreender a importância do rito na vida de qualquer ser humano. É preciso simbolizar o Caminho, o ir em busca, o voltar a se mover, o acreditar que posso conseguir, o superar-se a cada dia. É nesse vagão que sou apenas um bilheteiro. Com o apoio de voluntários amorosos abraçamos quem chega, marcamos o bilhete de quem vai, e abanamos as mãos, carinhosamente. Às vezes, são mais voluntários do que albergados, de tanta vontade de ajudar. Às vezes, porque os que caiam conseguiram terra firme, e voltam a caminhar com seus próprios passos, novo rumo.

Na foto, abaixo, o voluntário Marco Túlio passa debaixo do viaduto com o Wander, passos firmes, compassados, rumo a um dia de céu azul. São muitas tempestades. E o abrigo que nunca pode faltar é o coração do próximo: a verdadeira estação que buscamos.






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