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Mostrando postagens de novembro, 2015

Questões de Linguagem e Tradução

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As minhas aulas no mestrado acabaram. Posso voltar para a casa da minha filha, onde moro, em Belo Horizonte. Daqui, da ilha interna de Florianópolis, paro e penso. E elejo a primeira coisa que devo agradecer em minha passagem por aqui: o encontro com Yeo N’Gana. Costamarfinense, magro, estilo corredor, das cambetas finas e compridas, voz grossa, sorriso maior que o rosto, maçãs do rosto bem salientes, olhos profundos, negro azul-marinho, Yeo é um irmão que ganhei depois de 42 anos de vida. Moral, ética e inteligência de fazer inveja, Yeo é uma vara de bambu. Resiliente. Forte. Firme e absolutamente natural. Seu silêncio grita: – “Quando você fala baixinho, nos ouvidos, a pessoa escuta com a alma.”, me disse um dia. Aprendi muito aqui nesses 4 meses intensos de quase prisão domiciliar. Mas aprendi mais mesmo tentando Traduzir o meu novo irmão Yeo. Pra começar, foneticamente, seu nome é um Koan Zen Budista. Quando o chamo, pergunto por mim: “E eu?” A letra “e” é fec

Só para quem tem vergonha

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Durante 5 anos dei aulas na Faculdade Estácio de Sá. Um período muito interessante, de muita aprendizagem. Onde fiz amigos, onde intensifiquei muitas amizades. Onde ganhei a admiração de alguns alunos e ganhei o ódio de alguns outros. Imagino que minha passagem por lá tenha tido saldo positivo, pelos feedbacks que tive ao longo do tempo. Certa vez, me vi com um dilema: um dos meus alunos mais simpáticos, de quem me lembro bem o nome, me entregou um trabalho final que a gente chamava de "ctl+c ctl+v". Chupado da internet. O trabalho inteiro era encontrado na universidade fluminense. À época, eu dava aulas de redação publicitária para mídia eletrônica, e produção em rádio e tv. Quem lida com textos todo dia, escritor por paixão, leitor razoável, sabe muito bem o que representa um estilo. Com um ou dois trabalhos se tinha a noção exata de quem sabia escrever, quem tinha bom domínio da articulação, quem possuía alguma técnica clara, quem tinha dificuldades, quem ti

Quero Amanhecer Mijado

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Eu era ainda um garoto de pouco mais de 17 anos. Talvez 20. Isso foi há uns 22 anos, portanto. Participei, não me pergunte exatamente porquê, de uma reunião de uma associação de músicos mineiros que se encontravam para lutar pelos direitos autorais. Eles continuam se encontrando, essa é uma questão sem fim, quanto mais em tempos de internet, DJ’s, mp3, e de uma época pós Napster.  Determinada hora, um deles, bem mais velho do que eu, fez um comentário sobre um associado "audaz" - pra homenagear o Grande Fernando Brant, que também fazia parte da associação e depois veio a presidir uma outra de muito maior envergadura e soluções pros músicos - que me deixou muito incomodado:  – Tá vendo? Mexer com menino dá nisso, a gente amanhece mijado.  Fiquei incomodado por três motivos básicos:  Primeiro é que a ação do associado audaz tinha sido unicamente audaz. Apenas uma ação feita sem consultar o reclamante, com o objetivo de dar solução a uma questão qualquer,

É Natal, filha.

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É muito difícil quando chega o natal.  O natal sempre foi uma época difícil em minha vida. Como meu pai foi o décimo quinto filho de uma família pobre de Teófilo Otoni, seus natais foram marcados pelas diferenças dos sobrinhos que tinham condições e meu pai que não tinha. Na família da minha avó, aquela história de comprar um sapato pra dois filhos e um ir com um chinelo e uma atadura no pé esquerdo e o outro ir com o chinelo e a atadura no pé direito pra aula foi verdade.  Meu pai foi marcado pelo palpite de vários e vários irmãos acima dele, cunhados e cunhadas que tinham idade pra serem seus tios e pais que já tinham idade para ser seus avós. Isso fez com que ele escolhesse o caminho da individualidade. Para virar o adulto (maravilhoso) que é. Acontece que o natal não tem a ver com individualidade. Não tem a ver com a escolha da partida. Tem a ver com a escolha da partilha.  E um dia, ele chega, podemos escolher: vamos ter natais marcados por nossas dores, ou nat

Vale tudo

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Estou destituído. Estou detonado. Estou possuído, arrasado, subvertido, arruinado, falido, afundado. Enlameado. Não quero mais o mármore branco com veios champagne, não quero mais a cozinha gourmet associada a la joie de vivre, o vinho caro e o untuoso opulento foie gras. Nem tinto vinho. Vem. Preciso me lavar primeiro. Estou sujo de barro. Como vou poder entrar em casa e limpar meus pés no tapete persa? Como vou me deitar na cama de roupa de cama de linho egípcio 3.000 fios comprada na Trusseau? Como vou abrir os armários para pegar as vasilhas Le Creuset para fazer o almoço? Eu pingo lama. Nas minhas veias correm um barro sujo imundo, de minério, sangue ferroso que um dia me orgulhou. São minas, mas não são gerais. É pra poucos. É para o governante que não se compadece, e tem dozinha de empresa que nem imaginava que isso podia acontecer... É para o que não teve seu filho desaparecido, não teve seu pai afundado, atolado, esmagado, espremido, afogado, sem

Sóis

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Vivo na ausência. Escuto mais do que falo, calo porque silencio, calo porque silêncio. É que dói. Pressência. Vive no sentimento. vive nu sem ti: minta. Mate. Arde. Devore. Devo. Ore. Faça o que fizer, anuncie. Anule o que anelar. Sois o segredo do analema. Dilema: Moro no silêncio escondido em cada palavra. Nas ditas, não ditas, malditas.