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Mostrando postagens de 2015

O Natal e a Verdade (para a mãe de minha filha)

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Há pouco tempo, um amigo me disse:  – Sabe? Quando ouvimos um lado só de uma história, sabemos muito pouco sobre ela... E pouco depois me deparei com essa imagem: Desde então, tenho meditado muito sobre isso. Meditei durante os meus três meses de peregrinação, inclusive. Quando escrevi um texto sobre o natal desse ano de 2015, que aqui coloco o link, eu não poderia supor que... SIM : o Menino Jesus estava me preparando uma surpresa. O Natal desse ano transcendeu a espera, o sonho, o meu conceito de alegria. A primeira foto desta página retrata um fragmento disso tudo, que ocorreu hoje, na hora do almoço, quando minha filha e sua mãe almoçavam na casa dos meus pais, em Belo Horizonte. Depois de uma espera de 4 anos, neste natal pude pegá-la sem ser cerceado, com a confiança devida, com o respeito que todo pai e toda mãe merecem. Minha filha vai ficar até o final de janeiro em Belo Horizonte e, finalmente, tenho a oportunidade de sair com ela como o pai que sou...

Questões de Linguagem e Tradução

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As minhas aulas no mestrado acabaram. Posso voltar para a casa da minha filha, onde moro, em Belo Horizonte. Daqui, da ilha interna de Florianópolis, paro e penso. E elejo a primeira coisa que devo agradecer em minha passagem por aqui: o encontro com Yeo N’Gana. Costamarfinense, magro, estilo corredor, das cambetas finas e compridas, voz grossa, sorriso maior que o rosto, maçãs do rosto bem salientes, olhos profundos, negro azul-marinho, Yeo é um irmão que ganhei depois de 42 anos de vida. Moral, ética e inteligência de fazer inveja, Yeo é uma vara de bambu. Resiliente. Forte. Firme e absolutamente natural. Seu silêncio grita: – “Quando você fala baixinho, nos ouvidos, a pessoa escuta com a alma.”, me disse um dia. Aprendi muito aqui nesses 4 meses intensos de quase prisão domiciliar. Mas aprendi mais mesmo tentando Traduzir o meu novo irmão Yeo. Pra começar, foneticamente, seu nome é um Koan Zen Budista. Quando o chamo, pergunto por mim: “E eu?” A letra “e” é fec

Só para quem tem vergonha

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Durante 5 anos dei aulas na Faculdade Estácio de Sá. Um período muito interessante, de muita aprendizagem. Onde fiz amigos, onde intensifiquei muitas amizades. Onde ganhei a admiração de alguns alunos e ganhei o ódio de alguns outros. Imagino que minha passagem por lá tenha tido saldo positivo, pelos feedbacks que tive ao longo do tempo. Certa vez, me vi com um dilema: um dos meus alunos mais simpáticos, de quem me lembro bem o nome, me entregou um trabalho final que a gente chamava de "ctl+c ctl+v". Chupado da internet. O trabalho inteiro era encontrado na universidade fluminense. À época, eu dava aulas de redação publicitária para mídia eletrônica, e produção em rádio e tv. Quem lida com textos todo dia, escritor por paixão, leitor razoável, sabe muito bem o que representa um estilo. Com um ou dois trabalhos se tinha a noção exata de quem sabia escrever, quem tinha bom domínio da articulação, quem possuía alguma técnica clara, quem tinha dificuldades, quem ti

Quero Amanhecer Mijado

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Eu era ainda um garoto de pouco mais de 17 anos. Talvez 20. Isso foi há uns 22 anos, portanto. Participei, não me pergunte exatamente porquê, de uma reunião de uma associação de músicos mineiros que se encontravam para lutar pelos direitos autorais. Eles continuam se encontrando, essa é uma questão sem fim, quanto mais em tempos de internet, DJ’s, mp3, e de uma época pós Napster.  Determinada hora, um deles, bem mais velho do que eu, fez um comentário sobre um associado "audaz" - pra homenagear o Grande Fernando Brant, que também fazia parte da associação e depois veio a presidir uma outra de muito maior envergadura e soluções pros músicos - que me deixou muito incomodado:  – Tá vendo? Mexer com menino dá nisso, a gente amanhece mijado.  Fiquei incomodado por três motivos básicos:  Primeiro é que a ação do associado audaz tinha sido unicamente audaz. Apenas uma ação feita sem consultar o reclamante, com o objetivo de dar solução a uma questão qualquer,

É Natal, filha.

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É muito difícil quando chega o natal.  O natal sempre foi uma época difícil em minha vida. Como meu pai foi o décimo quinto filho de uma família pobre de Teófilo Otoni, seus natais foram marcados pelas diferenças dos sobrinhos que tinham condições e meu pai que não tinha. Na família da minha avó, aquela história de comprar um sapato pra dois filhos e um ir com um chinelo e uma atadura no pé esquerdo e o outro ir com o chinelo e a atadura no pé direito pra aula foi verdade.  Meu pai foi marcado pelo palpite de vários e vários irmãos acima dele, cunhados e cunhadas que tinham idade pra serem seus tios e pais que já tinham idade para ser seus avós. Isso fez com que ele escolhesse o caminho da individualidade. Para virar o adulto (maravilhoso) que é. Acontece que o natal não tem a ver com individualidade. Não tem a ver com a escolha da partida. Tem a ver com a escolha da partilha.  E um dia, ele chega, podemos escolher: vamos ter natais marcados por nossas dores, ou nat

Vale tudo

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Estou destituído. Estou detonado. Estou possuído, arrasado, subvertido, arruinado, falido, afundado. Enlameado. Não quero mais o mármore branco com veios champagne, não quero mais a cozinha gourmet associada a la joie de vivre, o vinho caro e o untuoso opulento foie gras. Nem tinto vinho. Vem. Preciso me lavar primeiro. Estou sujo de barro. Como vou poder entrar em casa e limpar meus pés no tapete persa? Como vou me deitar na cama de roupa de cama de linho egípcio 3.000 fios comprada na Trusseau? Como vou abrir os armários para pegar as vasilhas Le Creuset para fazer o almoço? Eu pingo lama. Nas minhas veias correm um barro sujo imundo, de minério, sangue ferroso que um dia me orgulhou. São minas, mas não são gerais. É pra poucos. É para o governante que não se compadece, e tem dozinha de empresa que nem imaginava que isso podia acontecer... É para o que não teve seu filho desaparecido, não teve seu pai afundado, atolado, esmagado, espremido, afogado, sem

Sóis

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Vivo na ausência. Escuto mais do que falo, calo porque silencio, calo porque silêncio. É que dói. Pressência. Vive no sentimento. vive nu sem ti: minta. Mate. Arde. Devore. Devo. Ore. Faça o que fizer, anuncie. Anule o que anelar. Sois o segredo do analema. Dilema: Moro no silêncio escondido em cada palavra. Nas ditas, não ditas, malditas.

Sapoti

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O sapoti é uma fruta difícil de definir. Carnuda, do tamanho de uma laranja pequena, tem uma coloração, cor e sabor muito característicos. Minha amiga da França me perguntou como é. Eu pelejei pra definir e fiquei dias pensando com o que se parecia, para que ela tivesse uma ideia aproximada do que é um sapoti. Curioso. Fazendo mestrado em Tradução, isso faz todo o sentido pra mim. Não há como traduzir o sapoti. Como bem disse Rubem Alves a respeito de um poema, “o poema é como uma árvore. A gente não explica uma árvore. A gente se deita à sua sombra”. Pois bem. A gente não explica o sapoti. A gente parte ele no meio e come. E, se for esperto, planta as quatro sementes. Foi isso que eu fiz com o primeiro sapoti que minha filha me deu, do quintal dela, onde ela mora, em Recife. Marrom por fora, marrom por dentro. Por dentro, um pouco mais claro. Por fora, mais próximo à cor de terra, mas não terra negra, nem terra vermelha. Terra marrom. O sapoti tem como casca, um couro. Parece um cou

O Templo do Outro

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Vou montar uma igreja. Seu nome vai ser Templo do Outro. Primeiro vou comprar um lote, construir um anfiteatro de cimento, octogonal, com oito níveis de degraus, com oito pilares em cada um dos seus vértices, coberto de piaçava. Este lote não vai ter muros. Este anfiteatro não vai ter paredes. Entra-se por qualquer um dos oito lados, sai-se da mesma forma, por qualquer um deles. No centro, no nível mais baixo, um altar. Que não terá esse nome porque, conforme a etimologia da palavra, não vai ficar no lugar mais alto. Vai ser no mais baixo, símbolo da humildade humana. Podemos chamá-lo, portanto, de Coração. Na entrada (ou saída) norte, vamos escrever e inscrever, ainda com o cimento molhado, a letra Z significando Zehut, Retidão. Nosso norte vai ser a Retidão. No oeste, onde o sol se põe, colocaremos a letra M, significando Mehilá, o Perdão. Em seu lado oposto, no leste, onde o sol levanta, colocaremos a letra B, significando Beraca, ou seja, Bênção. E ao sul, colocaremos a letra H,

O Amor depois dos 35.

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O cursor pula na tela. Como escrever? O que dizer sobre o Amor escolha? És. Colha. Já usei muito essa poesia semântica. Aliás, quando eu morrer, talvez façam uma notinha de jornal com esta epígrafe: “morre um dos criadores da poesia semântica”. Sim, quando a gente passa dos 35, começa a pensar na morte. Porque de alguma forma, você já se deu conta que “...podia ter subido mais montanhas...” ah, sei lá. Não vou ficar aqui citando poema dos outros, porque isso não leva a lugar algum. Depois dos 35 começa a pensar na morte e a vida vira um tesão. Fazer 35 não é brinquedo não. Quanto mais quando você descobre que você espirra e tá com 42. E ainda fingindo ter 35. Ou querendo ter... Com trinta e cinco você se lembra de uma cacetada de filósofo foda que com 35 já tinha resolvido a vida e inscrito seu nome no tempo do sempre. Com 35 você pensa que Jesus viveu só 33 e você já tá no lucro, e ninguém vai se lembrar de você daqui 200 anos, quanto mais daqui 2015. Daí, você me

Para quem tem prateleiras.

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Essa é mais uma tentativa de fazer alguma diferença na vida de alguém. Hoje cedo, recebi de um amigo (dos mais antigos que tenho) um comentário irônico sobre o 4 a 0 do Santos no Clube Atlético Mineiro, time que torço, time que foi presidido por meu avô, o delegado de polícia Hélio Soares de Moura, na época que o Kafunga jogava. Fiquei curioso: o Cruzeiro teria ganhado de quanto, para que meu amigo viesse me sacanear? Não, ele empatou em casa, com o lanterna do campeonato brasileiro. O que quer dizer: o prazer do meu amigo - e digo amigo porque sei que ele é - era simplesmente com a minha “desgraça”.  Podemos analisar de um modo simples, como atitude corriqueira e sem nenhum fundamento. Acontece que quando deixamos essas coisas passarem e viram coisas corriqueiras, simples, estamos fazendo a nossa parte para que se perpetue a condição que queremos mudar, acredito. Não acho que o brasileiro é filho da puta por natureza. Não acho que a malandragem tá no sangue

Quero Despedir

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*Na foto, o "Portal Grande Sertão" do artista plástico Léo Santana. Bem disse Guimarães Rosa: “Despedir dá febre”. Pois bem, eu quero a febre. Quero despedir. Quero o não querer, quero o que vier, quero a natureza plena, toda, simples. Quero a mais pura verdade. Não quero pedir nada, quero despedir. Despido de desejo, despeço. Pedido cobrança, pedido lembrança, pedido ciúme. Pedido questão, pedido perdão, pedido súplica. O pedido é o perdido que quer se encontrar. Mas não. Despeço, despido, despedido. Nu que não aguarda roupa. Sem emprego que não espera trabalho. Quem parte. Quem despede pode partir em paz. Partir sem pedir é a liberdade total. Amigo meu tem um caso de amor com Londres. Ele está na porta do prédio e joga uma moeda. Cara, esquerda. Coroa, direita. Assim ele vai, se perdendo, perdido, encontrando a inusitada presença do desconhecido, do não desejo, do que pode surpreender efetivamente. Quando não expectativa, o novo real se apresenta.

Ponto

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cursor pula na tela que palavra escrever? nenhuma cabe todas escorrem no papel eletrônico cabe nenhuma nada vazio inunda a gente como no conto de luz do Garcia Marquez não invento a roda vou barulhinho de aro tec tec tec tec limpa o líxico barulhinho polifônico trago em meu silêncio límbico lâmbido os méis soníferos doces viagens despertam sonhos cá estou cavou não tem pressa de voltar Deu-se estrada infinita fé se frases crensentença têxticamente Folha Branca envolve tudos

A gente só quer um abraço, Dave Grohl.

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Você conhecia Cesena? Eu ia perguntar se você conhecia o Foo Fighters, mas aí eu fiquei com medo da resposta. Engraçado isso. Na faculdade, uma amiga começou a namorar um cara e fomos passar o final de semana no meu sítio, esquema casais. Vinho vai, vinho vem, sou surpreendido com essa pérola que regurgitou da garganta do porquinho: – “Elis Regina? Quem é essa dona?” Minha taça quase caiu, em ato de estupefação preconceituosa. Sim, acredito que somos assim. Muito preconceituosos. No meu caso, devo dizer, meus preconceitos são de outra ordem que não os mais comuns, passíveis de penalidades na legislação. Ainda assim, dignos de serem trabalhados. Por que cargas d’água eu deveria achar que todo ser humano habitante do Brasil com idade (hoje) de 40 a 45 anos, tem obrigação de conhecer, ou pelo menos ter alguma referência sobre Elis Regina? Me lembrou aquele ato preconceituoso contra o Zeca Camargo - um apresentador da Rede Globo - que fez uma crítica à comoção

Preciso mostrar a língua?

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Os modernos já usaram “vou bater um fio pra você”. “Disca pra mim”? Era usual. Há 150 anos, praticamente, não existia o telefone no mundo. Hoje, praticamente, ele também não existe mais. Não, não existe, praticamente. Existe a função de ligar para outra pessoa em um dispositivo, mas quase não se vê mais o telefone telefone. Dispositivos móveis. Poderiam muito bem ser chamados de computadores de bolso. Porque nem telefone de bolso são mais, bem da verdade. E, sem falar nas outras funções, a função híbrida, o contato de voz, o de imagem, o de voz e imagem, o de texto, o de texto e voz e imagem se misturam e se completam, recadamente falando, cutucalmente existindo. Presencialmente virtuando-se. Aliás... Virtual ou virtuoso? Máscara social, muleta semântica, válvula de escape, encontramos um modo matemático de resolução da ubiquidade. Me lembro de Santa Clara. Que virou santa (também) porque, entre seus milagres, a visão do que acontecia com São Francisco em outro lugar, quando ela não

Hosana

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Moro no arqueio das sobrancelhas de Beatriz. Vivo sua explicação da vida, sinto sua admiração compreensão duvidosa da existência, seivas suas simples verdades: “sou diferente, papai”. É sim, filha. Come mesmo a salsicha do cachorro quente antes. Deixa o pão pra comer depois. A gente bobo é que faz tudo junto, bobamente esperdiçamos o Tesouro de Kairóz comendo tudo junto, barulho que acorda Chronos, matalmente. Isso, sim, é desperdício do ócio do amor, é querer que a planta cresça logo, sem respeitar o Vento, a Chuva, o Sol. A natureza das coisas franze a testa de Beatriz. Eu, riacho de mim. Enquanto a chuva chove águas líquidas e molhadas na superfície aculturada de Recife, olho. Molho. Observo. Escorro me todo em poças pra Beatriz pular de alegria, espalhando águas e afetos, botas de borracha, gritinhos entusiasmados de aventureira menina. Me nina na rede. Me em todos os cantos, canta, cantilena sutil. É ave, é Maria, passarinha. Hosana, filha. Sou tão pequeno, sou só um acorde na m

Pegadinha do Faustão

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Parece pegadinha, tal é o absurdo que foge à lógica da compreensão. Mas não pode ser considerado nem piada de péssimo gosto: o adesivo criado que coloca a Dilma de perna aberta no reservatório de combustível dos carros é triste retrato da violência que desintegra nosso país deixando nódoas difíceis de serem apagadas. Não tenho vergonha alheia. Tenho vergonha, eu mesmo, por mim mesmo, de fazer parte de um país que chega a esse ponto. Não consigo acreditar que isso seja manobra nem da oposição, nem de uma atitude guerrilheira perversa do partido da situação, que tenha como estratégia a disseminação do ódio e de uma ideia dicotômica de país, de partidos, de bem e de mal. Estamos mal. Todos. A indignação deveria ser geral. E, evidentemente, não só por isso. É claro que isso fere as mulheres. Mas nós, homens de bem, que tivemos oportunidade de educação e cultura, igualmente nos indignamos. Ou deveríamos.  Estupra-se o ser humano.  Não só a Dilma, o cargo que ela ocupa ou a

Para Fernando, Nestor, Manoel e Beatriz.

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Em setembro de 1990, depois de nove meses de intensa preparação, 20 músicos, atores, dançarinos, bailarinos, cantores, instrumentistas subiam no palco do Teatro do SESI para a estreia do musical Manoel, o audaz. Com direção geral de Nestor Sant’Anna - meu pai, que hoje completa 71 anos - e roteiro de um de seus parceiros de sonhos e ideais, Fernando Brant. Dois grandes pensadores e agitadores culturais, Nestor Sant’Anna e Fernando Brant passaram a vida sendo vozes de um mundo que eu ainda não conheci. Um mundo onde a cidadania, a honra, a verdade, a justiça são Valores inabaláveis. A fala dos dois, que vem desse mundo sonhado por eles e por tantos parceiros que comeram juntos a poeira da estrada por onde passou o jipe Manoel, ecoa em meu coração até hoje, e é o discurso que, quero crer, minha filha de 4 anos vai ouvir de mim e vai pronunciar de seu jeito aonde o povo está. Fernando embarcou em definitivo no Manoel, o audaz. Todos nós embarcaremos. Em meus sonhos mais íntimos