Rubem Alves, Berenice Menegale e o meu relógio do Mickey



Vago espaço no Tempo: sou eu a observar o Sempre. 

Tempo amigo, tempo perigo, tempo abismo inexorável. Tempo jardim. Busquei um tempo pra mim. E me tornei seu amante.

Ontem, recebi de presente do tempo um espaço: estive com a querida Berenice Menegale no sítio, em São Sebastião das Águas Claras. Queria poder chamá-la de Mestre. Mas seria injusto com ela. Assim, ouso chamá-la, simplesmente, de "querida" e "exemplo". Ela é exemplo pra mim e pra tanta tanta gente... 

Sentei-me no sofá, atrás do piano. E ela disse ao meu pai:

–Nestor, vou começar com uma que você gosta. E começou a fazer carinho no piano.

Então, eu pensei na paz. No amor profundo. Na saudade que tenho do abraço apertado e longo que nunca dei em Rubem Alves e no carinho que ele já fez em mim, tantas vezes, com todas aquelas palavras: espaço no tempo. O rosto do Sempre. 

E enquanto Berenice fazia carinho no piano, ele solfejava, agradecido.

A medida que as lágrimas iam transformando, pouco a pouco, o meu olhar, se revelava a menininha da foto da matéria que li na Revista Ecológico, com o título: "Dois Olhos Profundamente Azuis". E os meus olhos eram novamantemente os de Rubem. E vi no tempo a velha beleza. A fusão da beleza do broto que rompe a semente, com a do velho tronco de árvore, marcado pelo sabor das tantas estações. 

As mãos de Berenice eram as dessa árvore velhamenina que balançavam suavemente ao sabor do vento soprado pelo piano, que solfejava em êxtase e agradecimento Clair de Lune, de Debussy.

Me vi do meu tamanho. E agradeci a Deus por estar vivo e ser só um tatu bolinha nesse imenso jardim. 

Na segunda gaveta do meu escritório tem um velho relógio de menino do Mickey. Um que os bracinhos marcam as horas. Resolvi nunca mais colocar bateria nesse relógio. No tempo do sempre, o Mickey permanece de braços abertos enquanto eu abraço Rubem e me sento aos pés do piano agradecido de Berenice.




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