Gonzaga - de Pai pra Filha



Ainda não sei como vou construir meus comentários sobre Gonzaga - de Pai pra Filho.

Talvez diga da dificuldade que um dia tive com meu pai. Talvez diga da saudade que tenho de minha filha. Talvez diga da minha filha sentada em meu colo, tomando açaí. Talvez diga que açaí nunca mais vai ter o mesmo gosto para mim.

Talvez comece apenas citando:

"Se a gente lembra só por lembrar / Do amor que a gente um dia perdeu / Saudade inté que assim é bom /  Pro cabra se convencer / Que é feliz sem saber /  Pois não sofreu... / 

Porém, se a gente vive a sonhar / Com alguém que se deseja rever / Saudade intonce aí é ruim / Eu tiro isso por mim / Que vivo doido a sofrer..."

Ou talvez não. Só diga que 60% do filme passei transbordando o há mar que faz ondas em mim.

Breno Silveira foi bem feliz em Dois Filhos de Francisco, acho. Até acredito que, filmicamente, é mais interessante que Gonzaga. Principalmente na questão estética. Mas Gonzaga tem uma verdade que é fatal, ou Natal, melhor dizendo. Vive-se ao ver Gonzaga.

Acho que é um filme mais pra homens do que para mulheres: porque desenvolve questões que, mesmo sendo universais, tangenciam muito mais o universo masculino que o feminino. As questões humanas estão presentes, mas o homem, o filho, o pai, nossos papéis, nossos encontros e desencontros, nossos medos e coragem são abordados de modo verdadeiro, muito humano, aberto... No começo do filme, o lettering "baseado em fatos reais" anuncia. No entanto, quando se mescla algumas cenas reais, fotos reais, e enredo, surge uma espécie de "teatro-documentário" na cabeça do espectador... Acho que meu querido tio José Tavares de Barros, crítico e cineasta que muito me inspirou e orientou nos caminhos da imagem, teria concordado com esse termo...

A verdade e o sentimento nu e cru me parecem que foram colocados em primeiro lugar no filme. E, acredito, seu mérito fica ainda maior por isso.

Penso, portanto, em indicar esse filme apenas:

  • para homens
  • para mulheres que querem entender os homens
  • para pais
  • para filhos
  • para mães que queiram entender os pais
  • para homens que sabem o que é o amor (e para os que querem saber)
  • para mulheres que querem amar de verdade
  • para os que sabem, há mar
  • para quem não sabe o que é a Verdade
  • para quem quer saber da Verdade
  • para mães que cerceiam o encontro dos pais com seus filhos
  • para meu pai
  • para minha filha
  • para o amor que se foi
  • e pra você, que teve a paciência de ler até aqui.





Comentários

Ainda bem que tive paciência... Beijos saudosos
Erica Machado disse…
Hoje, acomodada em minha poltrona senti meu pé direito bater no compasso da sanfona. Ele se movimentava em um ritmo tão sincronizado com a música que quase chego a acreditar que sou uma musicista nata. É que no fundo, assim como todo o meu corpo, meus pés sabem reconhecer o que é bom e, principalmente, eles pressentem a quais impulsos devem obedecer. O que meus pés “ouvem” é Baião – e dos bons.

Por um momento esqueço que estou no cinema, me sinto parte do Sertão, me deixo levar pelo acorde da música. A riqueza daquele som me faz entrar em cada cena, fazer parte de lugares onde nunca estive, mas parecem guardados na minha memória. Os conflitos entre os personagens abrem uma gaveta dentro de mim, jogam tudo pra fora, embaralham lembranças e me colocam por um instante naquela situação.

De quantos conflitos e delicadezas vidas são construídas. De quantos descobrir e redescobrir personalidades são moldadas. Não fui a um show sequer de Gonzaga, nunca pisei no Sertão, mas na minha veia corre um sangue puro tupiniquim. Sou paga pau desse Brasil, lindo até nas dificuldades, terra onde brota talento mesmo em lugares onde já não se brota mais nada. Fui embora do cinema com a sensação de ter visitado um lugar onde nunca estive, mas com aquele gostinho de ter voltado para um lugar de onde nunca saí.Tomei um café bem forte depois.

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