O estribilho do amor




Já comentei aqui sobre o diálogo de Jodie Foster e Matthew McConaughey (putz, conferi 3 vezes o nome desse famigerado pra escrever aqui no blog - imagino ele aprendendo a escrever o nome na escola, tadinho). Ele, reverendo. Ela, cientista. O embate entre ciência e religião posto à mesa. Zapeando, depois de suspirar com a Sharapova, caio justamente na cena que já vi várias vezes:

Festa, filme Contato, ele diz:
- Não imagino viver num mundo sem Deus.
Ela: - eu preciso de provas
Ele: - provas? você ama seu pai?
Ela: - sim, muito.
Ele: - prove.

É assim. Amor não se prova. Deus se prova. Tem gosto de amor. Amor se prova. Tem o tempero de Deus.

No filme, dentro da máquina espaço temporal em que faz a viagem extra terrestre, ela finalmente encontra galáxias, vislumbra o espaço, toda a criação, o uni-verso palavra de Deus, prova o sabor de saber além da crença, e diz:

- deviam tem mandado um poeta! eu não tinha ideia!...

Não, ninguém tem. Porque não passa pela ideia, pela razão, pelo raciocínio: o discurso lógico. A linguagem final mente, falta. E só o poeta, o músico, o artista plástico, só a arte, a poesia, a música. Só na fronteira entre a linguagem e o etéreo, a linguagem e o amor, a linguagem e Deus...

O ET conversa com ela. E diz que é assim. Que a vida é assim. São só sonhos e pesadelos. E que o vazio insuportável da existência só se cura com o Outro. E tudo termina em um beijo. Nesse caso, na testa dela. Me lembrei da dona Rosinha. Morava sozinha em um barracão no meio da estrada de terra indo para o meu sítio. A gente parava lá, minha mãe levava comida, biscoito, suco. E dona Rosinha despedia dela dizendo: dá um beijo na testa do seu marido, em sinal de respeito. Fico pensando se dona Rosinha assistiu Contato. Ou se o roteirista de Contato conhecia dona Rosinha.

A noite vem, e finalmente eu sonho. No sonho, minha avó paterna. Meu avô paterno (o poeta). Minha madrinha e meu padrinho. Meu padrinho me ajudava a reformar minha casa. Ele arrancava a janela principal. Peço ao meu avô: - o vô, faz um verso pra mim? E ele responde: - um verso não, um estribilho...

A diferença dos dois é que o estribilho também é um verso, mas uma espécie de refrão. Um que se repete ao longo do poema, que dá o tom, que retorna ao tema, que induz o ritmo, um mantra dentro do poema, acho que posso assim definir.

Sim, vô. Me faz um estribilho. Pedi a bênção pra minha madrinha com um beijo na testa, enquanto meu padrinho me ajudava a refazer a minha casa. Nela, um pé direito alto, sem paredes externas, aberta para o mundo.

No estribilho da construção poética da minha casa, a prova de Deus é o tempero do amor.

E a vida segue, seus mistérios.




Comentários

Lenda Brigia disse…
Maravilhoso, poeta... cada dia temperando melhor as palavras. Te amo... mas não posso provar!
Bê Sant Anna disse…
Não pode ME provar. hehehe
Também, sua muxiba.

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